Por Daniel Depp
Traduzido exclusivamente para o You Know - Brazilian Johnny Depp Fan Club
Eu fui a Hollywood, esperneando e gritando. Eu não queria ir. Eu sabia que seria um desastre, e foi.
Eu fui, é claro. Pela maioria das razões habituais. Eu sou tão ganancioso quanto o cara ao lado e, oh, há muito dinheiro em Hollywood. Eu também sou ligeiramente obcecado pelo poder, o que ajuda. E amo filmes. O que, ao contrário do que você pode pensar, não ajuda. Eu já mencionei que há muito dinheiro em Hollywood?
No início dos anos 90, eu vivia em Maine. Há partes de Maine que são belas, mas essa não era uma delas. Havia uma esposa, que trabalhava. Uma criança de um ano de idade, e havia eu tomando conta dela. Havia um monte de árvores. Havia um veado que costumava entrar no quintal todos os dias. No começo eu costumava dizer para a criança, "Oh veja, um veado, que fofo!". Até o final do segundo mês, foi "Oh veja, o veado de novo, ele está rindo para o papai, vamos explodir os malditos miolos dele, ok?"
Eu alimentei a criança com um monte de panquecas e tentei escrever um romance. O romance continuava se tornando um roteiro, depois um romance de novo, e depois um roteiro. Alguns críticos dizem que ainda tenho esse problema. Como o personagem Potts em meu romance Loser's Town, um indivíduo triste do tipo Bisonho¹ com grandes esperanças, mas cujos planos não conseguiu realizar, eu não estava feliz.
Assim veio o telefonema do meu irmão, o astro de cinema (tecnicamente meu meio-irmão). Ele estava fazendo Edward Mãos de Tesoura na Fox. O burburinho sobre o filme era bom, e os estúdios estavam finalmente olhando para ele como se ele pudesse fazer algum dinheiro. Este é um bom lugar para se estar em Hollywood.
"Você tem que vir aqui," disse meu irmão, o astro de cinema. "Há muito dinheiro. Vamos tirar cada centavo que pudermos obter. Mas temos pressa, não vai durar. Mais cedo ou mais tarde, eles vão descobrir que não consigo atuar."
"Acho que vou ficar aqui," disse. Eu, na verdade, estava tentando arduamente gostar de Maine. Havia muitas árvores, por exemplo. Uma pessoa deve gostar de árvores. Infelizmente, eu não gostava. "Você não pertence a esse lugar," disse meu irmão. "Você vai enlouquecer. Vou ler sobre você cortando pessoas com um machado." Acho que ele estava verdadeiramente preocupado com isso, especialmente porque eu descobri que grandes quantidades de vodka faziam com que as árvores fossem mais fáceis de lidar.
"Não," eu disse.
"Olha, nós poderíamos fazer o que sempre falávamos, lembra? Poderíamos fazer filmes juntos."
Ah. A Twentieth Century Fox tinha oferecido a ele um contrato em desenvolvimento. Um contrato em desenvolvimento é quando os executivos dos estúdios com olhos de verruma oferecem a um diretor ou ator uma barganha de Fausto². Nós lhe daremos um escritório e algum dinheiro, você nos dá a primeira olhada nos filmes que decidir que quer fazer. Lindo.
Só que não é. Ninguém mais coloca atores sob contrato, não como Clark Gable nos bons velhos tempos. Hoje em dia, atores surgem por toda parte, e um contrato em desenvolvimento é como colocar sal na cauda de um pássaro. Impede-os de voar.
Mas a verdade é que esses contratos são muito úteis [...]
Ainda assim é tudo muito animador no início. Como namorar a garota mais linda que você já viu, até perceber que ela não tem a menor intenção de dormir com você. A coisa é que, porém, você nunca pode ter certeza. Contratos assim são muito populares. Todo mundo quer estar nos filmes. É um sonho de barata: você nunca pode pisar na maldita coisa. Eu disse a meu irmão, o astro de cinema, que pensaria no assunto.
Então eu fiz a coisa mais madura e razoável. Eu me tranquei no banheiro com uma garrafa de vodka russa, fiquei bêbado e subi no avião para Hollywood.
Eles foram simpáticos comigo na Fox. Então outra vez, eu era o irmão da estrela, do modo que tinha que ser. Eles me deram algum dinheiro - muito para mim, naquela época - e um assistente pessoal.
[...] O problema é que eu não tinha respeito pelo lugar. Eu não tinha e não tenho agora. Eu não me importava (e não me importo) com o tipo de filmes que fazem ou a forma que querem fazê-los. Acho que o culto do estrelato é perigoso para os atores e arte, e que a ideia de fazer um filme apenas por dinheiro é um enorme desperdício de celulose e é venenoso para a alma humana.
Então, porque eu fui? Porque sou estúpido.
[...] Eu fui para Hollywood porque amo cinema, e eles não. Fui para Hollywood para provar o propósito que é possível fazer filmes por menos de um orçamento nacional que honrem o espírito humano e ainda fazem um pouco de dinheiro.
[...] Ir para Hollywood com esse tipo de fundo é como saltar em um poço de cães selvagens com uma costeleta de porco colada em seu traseiro. Eu estava procurando por uma briga, de qualquer maneira. "Viel Feind, viel Ehr," diz um ditado alemão. Muitos inimigos, muitas honras. Bem, a primeira parte é verdade.
Foi um desastre como esperado. Passei a maior parte do tempo em reuniões inúteis e lendo roteiros que eram perfeitamente bons, mas nunca seriam financiados. Era devastador se sentar do outro lado da mesa e dizer "não" a escritores.
[...] Evetualmente, fazíamos um filme, mas não em Hollywood. O Bravo foi essencialmente um filme estrangeiro em solo americano, financiado depois que negociamos nosso caminho através do festival de Cannes. O Bravo acabou estrelando meu irmão, o astro de cinema, e Marlon Brando e foi baseado em um "infilmável" livro de Gregory McDonald. Era a história de um rapaz pobre que vive em um lixão e concorda em se deixar assassinar em um filme por dinheiro suficiente para tirar sua família da pobreza.
Não, não era uma comédia. Foi possivelmente o livro mais triste já escrito. Havia um roteiro muito bom que já existia quando entrei para o projeto, mas era igualmente deprimente e igualmente "infilmável". O projeto, nesta época, se tornou uma lenda de Hollywood. Foi amaldiçoado. Todos concordavam que o roteiro era brilhante, mas ninguém conseguia enxergar como funcionaria como filme. Havia um diretor. Mas ele se suicidou. E sua mulher.
[...] Por outro lado, eu gostava de O Bravo pelos motivos que todos não gostavam. Eu gostei porque ninguém pensou que poderia ser feito. Todos concordaram que o filme não faria qualquer dinheiro, mas todos acreditavam que deveria ser feito, de qualquer maneira. Isso é completamente ilógico, é claro, mas não leva muito tempo para perceber que nada nos negócio faz sentido. Houve também uma sensação estranha de que talvez pudéssemos fazer algo belo. O Bravo quase me matou - quase matou todos que estavam conectados a ele, na verdade - mas é um filme que me orgulha. Foi massacrado pela crítica americana quando estreou em Cannes, em competição pela Palma de Ouro. Quando viu o filme, o diretor Emir Kusturica disse ao meu irmão: "Parabéns. Você acaba de fazer o primeiro filme comunista dos Estados Unidos."
Pessoas na Europa disseram-me que gostaram. Nunca foi lançado nos Estados Unidos, porque meu irmão, o ator de cinema, também gosta de provar seus propósitos. Viel Feind, viel Ehr. Esta é uma das coisas que amo nele.
Depois de O Bravo e da experiência em Cannes comecei a passar cada vez mais tempo na Europa. Especialmente na França. [...]
Um dia minha empresária me disse: "Você está indo bem agora, pode finalmente escrever esse romance." Nós estávamos falando sobre o romance policial em Hollywood. Eu tenho o que eles chamam de perspectiva interna, provavelmente o que significa que vou irritar muita gente.
A coisa é que, eu fui a Hollywood e, francamente, meu caro, eu não dou a mínima.
¹Bisonho é um personagem do desenho Ursinho Puff, o burro.
²De acordo com a lenda alemã, um pacto com o demônio.
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